Para desembargadora do TJ/SP, a análise depende do Promotor de Justiça e das provas; para advogado criminalista, como médico sabia que o sedativo em excesso poderia, eventualmente, causar a morte.

Preso em flagrante, acusado de estuprar uma mãe, logo após o parto, ainda na sala de cirurgia, em 11 de julho deste ano, o anestesista Giovanni Quintella Bezerra teve o pedido de revogação da prisão preventiva negado pela Justiça. Acusado de estupro de vulnerável, a audiência de instrução do processo está marcada para o dia 12 dezembro.
Novas imagens mostram aplicação de sedativos em excesso e o disparo de alarme no momento da violência sexual, que durou cerca de 10 minutos. Segundo médicos, a vida da paciente esteve em risco, uma vez que o alarme mostrava baixa saturação da paciente devido ao excesso de sedação e por ela estar com as vias aéreas obstruídas.
A desembargadora do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) e professora do Meu Curso Educacional, Ivana David, diz que as novas imagens, em tese, podem amparar acusação de homicídio, inclusive na modalidade de dolo eventual.

“Falando teoricamente, pois a análise depende sempre do Promotor de Justiça e das provas, o Ministério Público, titular da ação penal, teria que aditar a denúncia e mudaria o procedimento”, explica Ivana.

Para Leonardo Pantaleão, especialista em Direito e Processo Penal,”como médico e sabendo que o sedativo em excesso poderia, eventualmente, causar a morte, há a possibilidade da tentativa de homicídio com base no dolo eventual”, porém, ele lembra que “parte da doutrina e da jurisprudência entende que é possível a tentativa em dolo eventual e parte da doutrina entende o contrário, que dolo eventual não admite tentativa. É uma discussão jurídica que pode aflorar nesse caso concreto”, fala Pantaleão.

A defesa de Bezerra chegou a questionar legalidade da prova obtida e, portanto, de ausência de justa causa em razão da inexistência de indícios de materialidade e autoria. Para Ivana e Pantaleão, não há o que se questionar sobre ilicitude do vídeo.

“Segundo jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ), por serem captadas por terceiros, as imagens não geram qualquer ilicitude. Teoricamente, além das imagens, temos as testemunhas. Ainda que não presenciais, elas podem narrar tudo que assistiram no vídeo. Vale destacar ainda que nos crimes sexuais é muito comum não existir testemunha presencial, comumente, são cometidos às escondidas”, disse Ivana.

“Quando a Justiça recebeu a denúncia, com base nas imagens captadas por aquele celular, colocado ali, com a finalidade de gravar tudo o que acontecia dentro da sala, entendo que a chance é mínima, quase nula, que tenhamos uma invalidação desse meio de prova”, pondera Pantaleão.

Alegando histórico familiar de transtorno psicológico e o uso de remédios que aumentam a libido, a defesa do anestesista pede que seja feito um teste de demência o que poderia torná-lo inimputável.
Ivana diz que é comum a tese de inimputabilidade do acusado nos processos e que na audiência de instrução as testemunhas também poderão ser perguntadas sobre qualquer sinal de insanidade do réu. Além disso, o juiz, analisando as provas, pode indeferir o pedido de plano ou determinar o exame pericial.

“Dependendo do resultado, se declarado inimputável a época do crime, o acusado recebe a absolvição impropria e deve ser internado para tratamento psiquiátrico”, fala a desembargadora.

Pantaleão explica que o exame terá que comprovar a incapacidade mental do acusado na época em que praticou o ato.

“Se isso não ficar claro, demonstrado tecnicamente, não se pode cogitar a inimputabilidade e ele responde criminalmente pelas consequências do ato desenvolvido”, disse o criminalista.